domingo, 4 de julho de 2010

Desconstruir para reestruturar


Era uma manhã de quinta-feira quando entrei na redação ironicamente mal informado. Um pouco irritado com a resposta negativa aos recursos interpostos, comentei com o Renato a falta de bom senso da banca. Em resposta, ele me disse - independentemente daquilo - que eu havia passado. De fato, meu nome estava na lista, minha mãe chorava de emoção, meus familiares me ligavam para louvar o resultado. Eu, empolgado, não havia pensado que o barco que ía de vento em popa poderia enfrentar uma tempestade inesperada e virar. E foi o que, de fato, me ocorreu.

Um dia se passou, as dúvidas aumentaram e na sexta-feira subsequente fui informado de que a alegria duraria pouco. Subitamente, entreguei-me a uma tristeza infinita, emagreci o que me custara ganhar em massa magra e a dor de cabeça veio como um rompante. Faltava a nota da redação. A sentença não me deixava dúvidas de que as horas à fio gastas durante um mês inteiro teriam se evaporado. Fui mal avaliado, fui julgado com ausência de idoneidade, não fui compreendido naquela tentativa.

Por analogia, imagine você sentado na sacada do seu apartamento vendo o pôr-do-sol. O esplendor e a beleza tornam-se confundíveis com seu significado. As portas cerram-se mais cedo, a claridade e a luz dão espaço à escuridão, as pessoas cansadas abrigam-se em suas casas numa mudez intermitente, e assim o dia termina. O dia morre, é a morte do dia. E assim também morriam em mim todas as esperanças que tinha de ser aprovado tão precocemente em um concurso tão logo recém-formado. Morriam em mim tantos sonhos, tantos dias de espera, tantos projetos... e eu me tornava opaco e vazio, estúpido e inválido, triste e desamparado. Enquanto isso, minha mãe me cercava de frases de efeito, que confesso, mais me irritavam do que contribuíam para a autoestima. Além disso, continuava a dizer que não acreditava em milagres, que Deus não vê meus esforços, que não é justo, que não havia me premiado com um resultado condizente. A vontade que eu tinha era de me debruçar sobre a cama, me cobrir com um cobertor bem quente e de lá não mais sair. Me senti pequeno, frágil, simples. Um ser tristonho cujo ego havia se despedaçado naquilo que mais o fazia forte, substância de ferro. Tia Celina me dizia para não me deixar abater. Maria Anísia então se mostrou uma das amigas mais leais que já tive. No e-mail, ela alegava que fui vítima porque sai do lugar-comum, porque escrevo para pessoas de um nível cultural mais elevado, e que, portanto, não fui compreendido.

Uma semana se passou e foi então que me veio à consciência que o tempo é imperativo. Que o tempo tudo suporta, porque tudo passa. Que só o tempo - com suas pausas e silêncios, com sua morosidade que tanto me aflige - é que é capaz de curar as feridas e me recobrar os sentidos. Eu já não acreditava, mas esta foi a maior prova que tive até hoje de como é possível me reestruturar. É que havia me esquecido de como é possível eu me inventar de novo. De como tenho a possibilidade de criar, de curar os problemas do presente por meio de um silêncio cortante, porém vivo. Isso me fez lembrar de quantas perdas e ganhos tenho sofrido na vida. De quantas pessoas passaram por meu caminho e se despediram de maneira tão rápida - Lara, Vinicius, Sabrina... E eu, que tanto achava que não ia aguentar, acabei suportanto... Acabei fazendo disso tudo uma lição tal qual aprendi em Eclesiastes. Bastava apenas respirar. E dizer pra mim mesmo que nada é insuperável porque a vida é um processo, um rio que flui sem esperar que eu corrija meus erros e redirecione o futuro. Eu chorava pelo Brasil que perdeu o hexa e por mim mesmo nesse concurso. Porque esse problema é um vale cuja cabeceira me devora, mas de cuja profundidade consigui emergir. E ainda continuo vivo, pronto para a próxima queda e também pra me levantar.

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  2. Ain Primo, fica triste não, isso acontece com as pessoas mais inteligentes... por mais que as expectativas fossem grandes e a certeza que iria passar, pelo fato de ter feito uma alta pontuação, não desista, corra atras dos seus sonhos, você é muiiiiitisimo inteligente, e tem um potencial enorme. E, é por isso que acredito que não foi você que perdeu, não conseguindo atingir a aprovação, e sim eles que perderam o profissional BRILHANTE que você é.

    beeijos,
    saudades.

    ResponderExcluir
  3. Samantha, vc é ótima!! Obrigado pelas palavras carinhosas!
    Um beijo!

    ResponderExcluir