terça-feira, 2 de novembro de 2010

"Sim, a mulher pode"


Em época de eleição, as expectativas se renovam. O oxigênio parece que volta a circular e reaviva os ânimos. Cada vez que ouço o discurso do candidato eleito, é como se renovasse em mim as esperanças de que o Brasil e a política podem avançar. Ingenuidade ou não, é um momento único, especial, em que verdadeiramente sinto que as mudanças são possíveis. Me emocionei bastante ao ver a vitória de Dilma Rousseff (PT) à presidência da República. Não só por ser seu eleitor. Mas mais que isso. Com 55 milhões de votos, cerca de 56% do total dos votos válidos, Dilma foi a primeira presidente eleita. Uma mulher no posto mais alto de um país ainda tão machista, preconceituoso e cujas pessoas se deixam levar por ideias pré-fixadas.

No mesmo domingo, Dilma fez sua primeira declaração aos jornalistas. Depois, reuniu-se com a militância para festejar e fez o primeiro discurso transmitido ao vivo para todo o Brasil. Me chamou a atenção o tom que usou: conciliador, brando, ameno. O discurso da presidente foi carregado de emoção, começou falando que "sim, a mulher pode". Inúmeros compromissos foram fechados: governar com respeito à oposição, erradicar a pobreza e miséria profunda no país, garantir a estabilidade econômica, respeito à liberdade de imprensa e de culto religioso.

Por mais de 20 minutos ela falou e reafirmou as propostas que tem pro País. E isso me renova. Me faz pensar que, mesmo insatisfeitos, as coisas ainda têm rumo, e tudo se ajeita. Combate à corrupção foi outro compromisso. Depois do caso Erenice, por que não dá-la a chance de mostrar que a corrupção será punida?

Essa mineira de 62 anos tem muito a conquistar. Vai precisar trabalhar duro para governar um país de dimensões continentais e lutar para que os brasileiros tenham no Congresso vitórias com as reformas tributária e política entre muitas outras. Mas acredito nela. Não creio em perseguição à imprensa. E conheço sua capacidade gerencial e administrativa. Dilma é famosa pelo jeito durão e sério com o qual conduz seu trabalho. Traquejo político, jogo de cintura? Ela já está se habituando, como ficou patente nas entrevistas que deu depois de eleita.

Sorte à Dilma Rousseff. Ela será a presidente de todos os brasileiros, daqueles que votaram nela e dos que não votaram também. Não há motivos para discórdia ou rancor. A hora é de desejar-lhe sucesso. Se ela for boa gestora, ganham todos, ganha o Brasil. A vitória é coletiva.

sábado, 9 de outubro de 2010

Algumas constatações

- Estar frente a frente com a realidade é inovador.

- A realidade é algo que se faz, se produz. Não está fora de nós.

- Aprendi que equilíbrio emocional é fundamental.

- Hora de desvendar alguns mitos, consensos e ideias oriundas do inconsciente coletivo.

- Jornalista é um trabalhador, funcionário normal, não é estrela. Isso de jeito nenhum.

- É preciso viver cada dia em suas particularidades. Verdade, cada dia é um novo dia, e o aprendizado é eternamente inconcluso.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Como eles pensam


Ouça os dois lados, os dois mais fortes concorrentes. Não basta. Isso não será suficiente para ajudar a prever qual será o resultado do enfrentamento político de outubro. Não há previsão. Não há certezas. Não há vidente que acerte. Eleição se decide nas urnas.

Digo isso porque se formos pelo que dizem as pesquisas, não há dúvidas. Todas apontam que Marconi Perillo será o vencedor, talvez em primeiro turno. Entretanto, pesquisas não dizem tudo. Em Goiás, Marconi virou em 1998. Era um desconhecido. Apresentou-se como alternativa, enfrentou Iris Rezende, superou as expectativas dos ques não acreditavam. Venceu. Em 2006, a história se repetiu com seu sucessor. Alcides Rodrigues foi eleito.

Ultimamente, tenho me preocupado muito mais em ouvir do que em falar. Assim ganho muito, e muito me acrescenta. Nem sempre as fontes oficiais são as melhores. Há quase um mês, sentei ao lado do meu carona enquanto esperávamos o momento da partida. Muito experiente com campanhas, ele me dizia que a eleição é de Iris.

A fonte me contou que o presidente Lula encomendou uma pesquisa no início do pleito em que Iris aparecia como favorito a ganhar a eleição. Ele me disse que numa disputa eleitoral, a primeira pessoa a quem você precisa convencer é você mesmo. Só assim conseguirá convencer os outros da escolha que deseja que eles façam.

O rapaz me disse ainda que sente a energia da população em cada cidade que passa, onde o ex-prefeito de Goiânia é sempre recebido com alegria. Ele não acredita nos dados das pesquisas divulgadas pela imprensa. Prefere acreditar na de Lula. E não tem dúvidas de que Lula será uma peça fundamental para ajudar Iris a angariar votos.

Fiquei impressionado com a análise política dele. Realmente mostrou sabedoria. A situação deixou claro para mim o quando o tabuleiro político é altamente instável. Em eleições, não há garantias de vitória.

Quando encerrávamos a conversa, ele me perguntou se havia ficado boquiaberto com o que me contou. Ao responder afirmativamente à pergunta, ele me disse: "Thiago, tudo o que digo, é porque estou dentro da cabeça dos líderes. É assim que eles pensam!".

Apesar de me impressionar com a excelência da análise sobre o quadro eleitoral, ele tocou em algo excêntrico. E foi assim que logo conclui que, da mesma forma que Iris e seus correligionários estão certos de que as urnas estarão a seu favor, assim também marconistas e vanderlistas devem acreditar piamente na própria vitória. Se perguntarmos, cada um dará mil explicações apontando suas certezas. Porque é assim que eles pensam. Convencem-se a si mesmos, enquanto as dúvidas e incertezas permanecem na sombra, como se não existissem. E é por isso que quando o barco vira e as previsões não se confirmam, o choque os derruba subtamente.

domingo, 22 de agosto de 2010

Está vindo?

Tomo a liberdade para postar a coluna de Míriam Leitão publicada no dia 22 de agosto no jornal O Globo. O texto é excelente e as ideias são inspiradoras!


Está vindo?

O torpedo: “vocês estão vindo?” Estávamos indo, mas atrasados, por isso apressamos o passo até o Instituto Moreira Salles. Lá, em uma fria manhã de sábado, mergulhamos no maravilhoso documentário de Estevão Ciavatta sobre Ademar Casé. Ele não me sai da cabeça desde então, por isso me prometi rever quando for lançado no dia 3 de setembro.

O cineasta e documentarista trabalhou durante 10 anos a partir dos arquivos que recebeu da família Casé sobre Ademar, o avô da Regina. É uma história de mobilidade social, com tudo o que há de emocionante em vidas assim, mas é também o relato do começo da radiodifusão no Brasil. O primeiro programa do rádio brasileiro foi o do Casé. Revelou cantores que estão na história da música brasileira, inventou linguagens, fez o primeiro jingle, montou o primeiro cast, desbravou a novidade. Vendo o documentário, combati a ignorância sobre fatos que deveria saber.

Enquanto acompanhava o ágil, denso e leve documentário, fiquei pensando em quanto é breve o tempo. Nos primeiros anos de 1920 ele chega ao Rio de Janeiro, consegue inicialmente vender aparelhos de rádio às famílias — o hardware — e depois, nos anos 30, inventa uma linguagem nova para aquele veículo, o software. Tudo isso começou há menos de 90 anos. Antes de sair de casa, tinha me comunicado com um amigo no Cazaquistão que ouve meus comentários da CBN, em podcasts baixados no seu iPod diretamente da iTunes store. Isso é o presente. Do futuro, eu ouviria falar nos dias seguintes, num encontro em São Paulo: o Digital Age 2.0.

Pense rapidamente o que foi essa trajetória. Do rádio rudimentar, em que Casé inventava programas e Roquete Pinto antevia o futuro das comunicações, ao que se vive hoje. Na história da humanidade, 90 anos representam um cisco, um nada. O rádio, inclusive, sobreviveu a todos os vaticínios e é contemporâneo de seres nem imaginados anos atrás. O futuro nos trará novas surpresas; algumas podem estar entre nós e ainda nem entendemos.

Diante dessa rapidez do tempo, a aflição com certos atrasos brasileiros aumenta. Uma gigantesca distância separa o Brasil de outros países de comunicação mais rápida e tecnologia mais avançada. Uma enorme distância separa brasileiros dos dois lados da fronteira digital.

O Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) foi desenhado para servir de peça de propaganda. Foi posto no papel muito tarde, e ainda não saiu do papel. Deveria se discutir como incluir rapidamente os brasileiros na era digital, mas o tema é tratado com a superficialidade das mensagens eleitorais. Ainda que fosse vencida essa distância digital, e oferecida uma internet rápida ligando todo o país, não seria suficiente. Para entrar no mundo novo das comunicações, que começou na era do rádio, o Brasil precisa vencer outro atraso ainda mais antigo, ainda mais decisivo: o da educação.

Não vou chover no molhado em domingo de inverno. Todo brasileiro sabe que estamos atrasados na educação em relação a países mais e menos desenvolvidos que nós. Já me acostumei a sentir inveja da Coreia com seu sistema educacional construído em 40 anos de tenacidade e senso de urgência. Duro é sentir inveja do Uruguai, onde os alunos estudam em notebooks e as escolas estão informatizadas.

O mais importante não é olhar o que não fizemos. Não fizemos, e pronto. Não se conserta o passado. O problema sério mesmo é o futuro. O IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) tem como meta chegar a 2021 com o desempenho dos primeiros anos do ensino fundamental saindo dos atuais 4,6 para 6,0; nos últimos anos do fundamental, de 4,0 para 5,5; no ensino médio, de 3,6 para 5,2. De um a dez, o Brasil tem como meta atingir a nota média daqui a onze anos. Mais escandaloso: a meta para a escola pública é chegar a 2021 a um nível inferior do que a escola privada estava em 2005. Assim: o objetivo que se busca para daqui a onze anos é o ensino público dos primeiros anos do fundamental chegar a 5,8; quando em 2005 o ensino privado atingiu 5,9. No ensino médio, a meta é 4,9 no setor público, menos do que os 5,6 do ensino privado em 2005.

Se você atravessou todos esses números e me acompanha ainda no artigo pode estar se perguntando: o que o genial produtor, radialista, jornalista e empresário Ademar Casé tem a ver com tudo isso? Que associação estranha de ideias levou ao IDEB?

A palavra que junta tudo é ousadia. Se o Brasil não tiver ousadia nos suas metas na educação não conseguirá vencer a exigência preliminar para entrar com sua população no vertiginoso mundo de hoje em que a comunicação não é tema apenas dos comunicadores. Ela atravessa todas as outras áreas; muda a economia, a política, a sociedade, a educação, as relações afetivas. Não educar é não incluir, não conectar. É deixar à deriva parte da população.

Casé saiu da pobreza extrema e virou um homem rico; saiu do anonimato para a celebridade. Mas carregava uma certa tristeza de não ter estudado o que gostaria de ter estudado. Já famoso, contratou um professor para na hora do almoço, na sua mansão em Copacabana, ensinar inglês a ele e aos filhos.

Fiquei achando que seu arrojo de se lançar no mundo da tecnologia desconhecida, atravessar fronteiras sociais e, depois do sucesso, continuar aprendendo traz lições para o Brasil atual. Saí da sala de projeção achando que não tinha visto apenas uma bela história da Era do Rádio, mas um enredo com duas chaves para o futuro: ousadia e tenacidade. Quis mandar um torpedo para o país: “Está vindo? A sessão vai começar. Não se atrase mais.”

domingo, 8 de agosto de 2010

O discurso dos candidatos


A Band promoveu, na última quinta-feira (5), o primeiro debate entre os candidatos a presidente da República nas eleições 2010. Apesar das expectativas que tínhamos até então, o diálogo possível entre os quatro principais concorrentes mostrou que, quanto à retórica, nenhum deles está preparado. Não houve vencedor.

Dilma Rousseff (PT) chegou sorridente, bem vestida com um amarelo-claro bastante simpático, demonstrou elegância na postura e visual. Entretanto, tão logo se iniciou a disputa verbal, a petista deu indícios de que estava nervosa e apreensiva. Seus pensamentos muitas vezes perderam-se em si mesmos, expressando ideias inconclusas e de pouco significado. Ficou encurralada ao tentar respondar a pergunta de Serra sobre a pífia ajuda que o governo tem prestado às APAEs. Além disso, cometeu deslizes linguísticos sérios, a exemplo do "seje", num emprego verbal inadequado. Mas foi melhor do que imaginávamos. Dilma não é tão ingênua assim, conhece as ações dos governos Lula e FHC e demonstrou autoria, não sendo mera sombra projetada a partir da imagem do popular presidente brasileiro.

José Serra (PSDB) mostrou-se, assim como Dilma, prolixo. Estourou o tempo de fala inúmeras vezes, esqueceu-se das perguntas a ele dirimidas e fez cara de desinformado quando perguntado pela adversária petista sobre o que achava do programa de eletrificação rural Luz para Todos. De Serra esperávamos respostas contundentes, e, é claro, mais ataques a Dilma. Apesar da prodigiosa experiência administrativa e política que tem, ateu-se a comentários sobre a questão da saúde no Brasil, sendo chamado comicamente de hipocondríaco por Plínio de Arruda Sampaio (Psol). Criticou a péssima infraestrutura dos aeroportos brasileiros, dando destaque ao caótico Santa Genoveva de Goiânia, mas não esclareceu nem contemplou os demais projetos de seu eventual governo.

Marina Silva (PV) utilizou-se da palavra de maneira afetuosa, como sempre o faz. Seu discurso é cativante, sério, emocionado. Recordou sua alfabetização por meio do mobral aos 16 anos, falou, como sempre, de sua proposta de desenvolvimento sustetável para a economia do País, e da oportunidade que teve ao ser situação e oposição. Contudo, permaneceu no elogio ao governo petista por várias vezes seguidas, arrancando também de Plínio de Arruda comentários irônicos - "Seu discurso é o mesmo da Dilma. Achei que fosse do governo Lula também", disse o candidato do nanico Psol, deixando Marina desconcertada.

Plínio foi engraçado. Falou que, assim como Dilma e Serra faziam blocão no pergunta-responde, o mesmo faria entre ele e Marina. Iniciou o debate já dizendo sentir-se honrado de participar, já que o povo brasileiro deveria conhecer não só os três principais candidatos. Centrou-se na defesa da distribuição de renda, valendo-se de um radicalismo inoportuno e sem detalhar suas ideias, o que soa como despreparo.

O debate, enfim, foi morno, pode-se concluir. Não houve baixaria, mas também não se concretizou como uma discussão de alto nível, dado que temos candidatos experientes para assumir o cargo de maior responsabilidade de nação. Todos os presidenciáveis foram prolixos: falaram muito, mas a mensagem não foi suficientemente inteligível. Cometeram deslizes gramaticais, mostrando parcial inoperância no que tange ao domínio da Língua Portuguesa. Mas, pior que isso, deixaram os telespectadores à deriva...

Por cotejo, poderia dizer que os quatro elaboraram discursos vazios de conteúdo. Agora, resta esperar para ver como será o próximo debate, se estarão com o discurso afinado, usando argumentos convincentes para dar prova de que conseguem articular com eficiência a linguagem. Aquele que se serve do discurso de maneira adequada, imprime para si uma marca ideológica do lugar que ocupa. Só dessa forma um candidato tem sua proposta de governo bem interpretada. Com traquejo político, discurso lúcido e simpatia, poderá angariar mais votos.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Para onde vamos?


Para onde vamos? Esta foi a pergunta que me fiz enquanto conversava longamente com Consuelo. Nos encontramos para tratar de "negócios". Não obstante, quando nos cruzamos, não tem jeito de deixar a conversa técnica fluir sem que se fale de outros assuntos. E o assunto que imperava se chama tecnologia.


Consuelo é um dos poucos profissionais que me faz parar por alguns momentos e repensar o ditado popular do "é vivendo e aprendendo". Para significar melhor, diria que as coisas se tornam mais fáceis de ser compreendidas quando voltamos ao passado tendo a experiência do presente em mente. Quando ela fala, mergulho num profundo silêncio para ouvir.

Recentemente houve uma onda de demissões numa emissora de TV de Goiânia. Tentei compreender o fato por sua lógica, a lógica do capital: quanto mais tecnologia, menos gente. Mas isso é pouco e insuficiente. Consuelo me disse coisas de extrema valia que eu mesmo não pensaria com tamanha facilidade se apenas enclausurasse ideias nesta mente solitária.

Segundo ela, o jornalismo como um todo, especialmente na TV, está ficando cada vez mais multifuncional. Daí prevalece a lei do mais forte: os que se adaptam com facilidade, permanecem; os que apresentam dificuldades em lidar com o que é novo, cedem espaço para os jovens da geração Y. Tudo por um simples motivo - quem vale-se de programas de informática do calibre do Avid/Inews precisa estar preparado para pensar no compasso do mundo virtual.

O que ela quis dizer com isso? Que da mesma forma que nossa leitura tem mudado com a ascensão da internet e se tornado não-linear, também devemos nos preparar para aprender a editar e construir vídeos que não sigam o ponto a ponto, a lógica encadeada, o passo a passo. Não há razão para isso, já que "posso começar uma história do final". Que será dos sistemas filosóficos de indução e dedução? Talvez a morte ou, no mínimo, a estagnação.

É a segunda vez que essa história se repete. Consuelo me disse posteriormente algo que a Carol (Zafino) já havia me adiantado: nossos raciocínios não são uma constante, não se constroem por pontos sobrepostos, mas sim do contrário, como constatou Pierry Lévy. É preciso aprender a pensar como máquinas. Em um documentário que orientou, o grupo de TCC de Consuelo prezou por essa nova dinâmica da linguagem - os alunos utilizaram cerca de três blocos de vídeo em movimento na tela, simulando a mesma dinâmica das notícias dos sites as quais nossos olhos já se adaptaram a ler.

É um pensamento denso. Me deixou impressionado. Em poucos instantes lhe perguntei de onde emanava aquele entendimento - de algo lido ou de sua própria observação? Da observação acrescida de alguns estudos já publicados sobre o assunto, me respondeu. E a sensação que tive imediatamente foi a mesma que sinto cada vez que me ponho em diálogo com pessoas sábias. Senti que havia aprendido, que é necessário parar para observar o mundo e encontrar respostas prováveis ao futuro que vai chegar, que só construo meu presente a partir do passado que vivi e que me faz reavaliar e reaprender.

Uma pergunta me veio à cabeça: os jornais impressos, então, irão acabar? Esta não a fiz. Deixei para pensar por mim mesmo. Quem sabe, a resposta será uma negativa. Num artigo de domingo, Míriam Leitão (a quem admiro e gosto de ler) dizia que o livro não é só aquele formato que persiste desde Gutemberg, mas sim seu conteúdo somado ao sentimento afetivo e ao vínculo que com ele criamos. Sua conclusão foi de que o livro como o conhecemos pode até acabar no que tange ao formato, mas não no que diz respeito ao seu conteúdo e à prática com que o utilizamos.

Cada vez que ouço Consuelo minha cabeça se abre. Fiquei mais curioso ainda para ler o recomendado livro "Tudo que é sólido desmancha no ar", de Marshall Berman (infelizmente, ainda não tive tempo). Isso prova que não aprendo nada sozinho, não posso encerrar meus pensamentos em mim mesmo. Ainda tenho muito para refletir e crescer. Só no diálogo e na observação poderei, por conjectura, tentar adivinhar para onde vamos e em que direção caminhamos rumo ao mundo virtual.

domingo, 11 de julho de 2010

O crime da mídia


Atemo-nos aos fatos. O caso Bruno é mais um capítulo de novela o qual todo mundo sabia como iria terminar. A cadência de atos erráticos do goleiro do Flamengo deixa pistas pelas quais não precisamos esperar que a polícia desvende inteiramente para saber quem foi o mandante do crime. Basta observar a conjuntura do caso.

Um crime premeditado e sem sombra de dúvida passional. Bruno é o provável algoz e responsável pela morte da ex-amante Eliza Samudio. O caso, tão explorado pela mídia - sobretudo televisiva - fez-me lembrar de uma reportagem de capa da revista Veja publicada no ano passado. A matéria relatava como a fama e o dinheiro invadem a vida dos grandes jogadores do esporte mais fantástico do mundo e os faz pisar na bola com tamanha facilidade.

Vamos ao raio-x de cada um. Bruno Fernandes é um jovem goleiro de quem os psicólogos desconfiam ser um psicopata. Começou a carreira em Minas Gerais, onde foi abandonado pela mãe ainda criança. Morador de favela, família desestruturada, emocional inconsistente. Eliza Samudio saiu de casa muito nova atrás de fama. Beliscava jogadores para ganhar os holofotes. Sonhadora, apaixonada e inconsequente. Também abandonada pela mãe aos 5 meses de idade, cresceu sem um importante arquétipo de valores.

Um dia os dois se encontraram. Nasceu um filho fora do casamento do goleiro. O ato é decorrente de uma rotina nada inócua do mundo futebolístico: festinhas regadas a bebida alcoólica, prostitutas e drogas. Se houvesse uso da liberdade, haveria escolha pela contenção - diria Betty Milan. Não é preciso ser um gênio para saber como a história poderia terminar. Eliza seria apagada, vítima de um crime cruel - depois de morta, teria pedaços do corpo arremessados a rottweilers.

O fato é que os telejornais reverberam incansavelmente fatos policiais que tocam o emocional do telespectador. Este, por sua vez, passa a viver uma espécie de histeria coletiva em casos como esse. Quem dera se a imprensa, sobretudo televisiva, se debruçasse com tamanha contudência sobre outros assuntos de interesse humano: meio ambiente, política, história das sociedades, conflitos étnicos. Certamente, teríamos um povo muito mais interessado e crítico.

Me passa na cabeça que a imprensa jamais poderia sair-se neutra e incólume na cobertura de um caso desses. Ocorre que me questiono incansavelmente sobre a validade dos critérios noticiosos utilizados. Por que tamanha insistência em pautas policiais, por que tanto tempo gasto para se esmiuçar a vida e os atos criminosos dos personagens? O fato foi uma barbárie que toca a psique individual, mas enquanto gastamos tempo demais expondo a violência alheia, a sociedade fica amiúde distanciada do que se passa na sucessão eleitoral do país, por exemplo, fato que mexe indistintamente com nossa vida coletiva.

Perguntei à minha tia Gercy, que é delegada aposentada, por que a televisão gosta tanto assim de fatos policiais. A resposta? "Ela vive disso!". Mas não é porque vive disso que se pode tirar do telespectador a consciência crítica do que quer e precisa ver. Alguém já lhe perguntou se ele se sente tão atraído e fascinado assim pelo crime? O silêncio e a omissão também são um erro. E cada vez que a TV o pratica, tira de seu interlocutor a capacidade de discernir.

Ao caso, faltam as provas cabais para se incriminar o goleiro. E que ele pague pelo que tiver feito. À imprensa, como um todo, que se dobre à tarefa de aprender mais uma vez como um caso de violência pode ser coberto a partir de nuances mais responsáveis. Um bom começo seria abordar o problema como um mal crônico da segurança pública brasileira e da falta de proteção à mulher. Deste modo funcionaria como uma caixa de ressonância metafísica aversa ao sensacionalismo.

Falta a mídia mostrar também que Eliza não é de todo uma vítima. É, pelo que tudo indica, mais uma aproveitadora que tentou o golpe da barriga para satisfazer necessidades profundas de um inconsciente que tanto pulsava de desejos perigosos desde a infância. O final de sua vida já era digno de um enredo previsível. Mas este aspecto ficou omisso, uma lacuna implícita no discurso jornalístico. A sentença de Bruno cabe à Justiça decidir. Contudo, quem poderá decidir pela consciência do telespectador que a tudo assiste?


domingo, 4 de julho de 2010

Desconstruir para reestruturar


Era uma manhã de quinta-feira quando entrei na redação ironicamente mal informado. Um pouco irritado com a resposta negativa aos recursos interpostos, comentei com o Renato a falta de bom senso da banca. Em resposta, ele me disse - independentemente daquilo - que eu havia passado. De fato, meu nome estava na lista, minha mãe chorava de emoção, meus familiares me ligavam para louvar o resultado. Eu, empolgado, não havia pensado que o barco que ía de vento em popa poderia enfrentar uma tempestade inesperada e virar. E foi o que, de fato, me ocorreu.

Um dia se passou, as dúvidas aumentaram e na sexta-feira subsequente fui informado de que a alegria duraria pouco. Subitamente, entreguei-me a uma tristeza infinita, emagreci o que me custara ganhar em massa magra e a dor de cabeça veio como um rompante. Faltava a nota da redação. A sentença não me deixava dúvidas de que as horas à fio gastas durante um mês inteiro teriam se evaporado. Fui mal avaliado, fui julgado com ausência de idoneidade, não fui compreendido naquela tentativa.

Por analogia, imagine você sentado na sacada do seu apartamento vendo o pôr-do-sol. O esplendor e a beleza tornam-se confundíveis com seu significado. As portas cerram-se mais cedo, a claridade e a luz dão espaço à escuridão, as pessoas cansadas abrigam-se em suas casas numa mudez intermitente, e assim o dia termina. O dia morre, é a morte do dia. E assim também morriam em mim todas as esperanças que tinha de ser aprovado tão precocemente em um concurso tão logo recém-formado. Morriam em mim tantos sonhos, tantos dias de espera, tantos projetos... e eu me tornava opaco e vazio, estúpido e inválido, triste e desamparado. Enquanto isso, minha mãe me cercava de frases de efeito, que confesso, mais me irritavam do que contribuíam para a autoestima. Além disso, continuava a dizer que não acreditava em milagres, que Deus não vê meus esforços, que não é justo, que não havia me premiado com um resultado condizente. A vontade que eu tinha era de me debruçar sobre a cama, me cobrir com um cobertor bem quente e de lá não mais sair. Me senti pequeno, frágil, simples. Um ser tristonho cujo ego havia se despedaçado naquilo que mais o fazia forte, substância de ferro. Tia Celina me dizia para não me deixar abater. Maria Anísia então se mostrou uma das amigas mais leais que já tive. No e-mail, ela alegava que fui vítima porque sai do lugar-comum, porque escrevo para pessoas de um nível cultural mais elevado, e que, portanto, não fui compreendido.

Uma semana se passou e foi então que me veio à consciência que o tempo é imperativo. Que o tempo tudo suporta, porque tudo passa. Que só o tempo - com suas pausas e silêncios, com sua morosidade que tanto me aflige - é que é capaz de curar as feridas e me recobrar os sentidos. Eu já não acreditava, mas esta foi a maior prova que tive até hoje de como é possível me reestruturar. É que havia me esquecido de como é possível eu me inventar de novo. De como tenho a possibilidade de criar, de curar os problemas do presente por meio de um silêncio cortante, porém vivo. Isso me fez lembrar de quantas perdas e ganhos tenho sofrido na vida. De quantas pessoas passaram por meu caminho e se despediram de maneira tão rápida - Lara, Vinicius, Sabrina... E eu, que tanto achava que não ia aguentar, acabei suportanto... Acabei fazendo disso tudo uma lição tal qual aprendi em Eclesiastes. Bastava apenas respirar. E dizer pra mim mesmo que nada é insuperável porque a vida é um processo, um rio que flui sem esperar que eu corrija meus erros e redirecione o futuro. Eu chorava pelo Brasil que perdeu o hexa e por mim mesmo nesse concurso. Porque esse problema é um vale cuja cabeceira me devora, mas de cuja profundidade consigui emergir. E ainda continuo vivo, pronto para a próxima queda e também pra me levantar.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Para aquecer


Para aquecer os dias frios da data iminente, vamos esquentar um pouco o coração com a suavidade da poesia-música. Oxalá fosse eu o autor!


Ao que vai chegar

Voa, coração
A minha força te conduz
Que o sol de um novo amor em breve vai brilhar
Vara, escuridão
Vai onde a noite esconde a luz
Clareia seu caminho e ascende seu olhar
Vai onde a aurora mora
E acorda um lindo dia
Colhe a mais bela flor
Que alguém já viu nascer
E não esqueça de trazer força e magia
O sonho e a fantasia
E a alegria de viver

Voa, coração
Que ele não deve demorar
E tanta coisa a mais quero lhe oferecer
O brilho da paixão
Pede a um estrela pra emprestar
E traga junto a fé
Num novo amanhecer
Convida as luas cheia, minguante e crescente
E de onde se planta a paz,
Da paz quero a raiz
E uma casinha lá
Onde mora o sol poente
Pra finalmente a gente
Simplesmente ser feliz

(Toquinho)

domingo, 23 de maio de 2010

Papo de política


Está certo que aula de Espanhol não é o melhor lugar para se falar de política, muito menos de corrupção. Lá estamos para hablar como los hermanos, praticar la lengua e fazer os cansáveis e longos ejercícios. No entanto, é inegável dizer que o ambiente, tão familiar e à portas fechadas, não seja tão distante assim do lugar onde se praticam as negociatas e encontros políticos.

Pois bem, foi com todo esse clima, aproximadamente 20 minutos depois de começar a aula, que uma colega nossa tendo chegado já com atrasada, puxou da manga um assunto que até então eu tinha sido preterido de tocar. Tudo começou quando ela disse achar muito engraçado o fato de delegados morarem num Alpha Ville da vida. "Como pode uma pessoa que ganha 8 mil, sustenta casa e escola dos filhos, morar num lugar daqueles com um salário desse? Não tem jeito, tem coisa por fora!", denunciava minha nem sempre simpática colega. E no fundo, depois de relutar, reparei que ela estava certa.

Foi então que me toquei que este blog ainda não havia cumprido sua principal função: tratar de fatos objetivos da realidade. E eu até agora me ocupei muito de falar de coisas da vida, de assuntos mais pessoais e me esqueci de tratar de fatos jornalísticos, aqueles que tocam minha alma prazerozamente. E este foi um ótimo ponta-pé pra eu tratar de política, ahh, assunto que eu adoro! E é sobre isso que vou contar.

Tenho observado atentamente em minhas leituras a montagem do tabuleiro político em Goiás. O jogo ainda não está definido, mas o que se sabe até agora é que há três candidatos de frente concorrendo ao governo do meu Estado. Pelo PSDB, Marconi Perillo crava a proposta de um retorno triunfal, depois de ter deixado Goiás bastante escasso em termos de dinheiro público. Íris Rezende continua como um velho coronel, que ao invés de descansar, insiste em ser candidato pelo seu histórico PMDB. E, por fim, uma inédita terceira via: Vanderlan Cardoso (PR) com apoio total da máquina administrativa alcidista.

Não há nada melhor e mais enriquecedor do que boas conversas. Minha colega me surpreendeu ao mostrar-se como fonte qualificada - conhece os grandes nomes políticos de Goiás, está atenta, acompanha, sabe da verdade. As pesquisas mostram Marconi e Íris tecnicamente empatados, com uma ligeira vantagem do tucano sobre seu adversário mais polarizador. Vanderlan larga lá atrás, num quadro de grande distância, mas nada que o poder de aglutinação, capilaridade e respaldo do governo não possam inverter por meio de um trabalho árduo e uma equipe eficiente - Goiás viu esse mesmo panorama se repetir por duas vezes, em 1998 e 2006.

Pensava comigo que Vanderlan seria o menos beneficiado. Fui surpreendido mais uma vez: segundo minha colega-fonte, ele é o candidato que mais terá recursos para a campanha. E além disso, mostrou-se um ótimo gestor durante os dois mandatos em Senador Canedo: a cidade não depende em nada de Goiânia, tem água e esgoto próprios, um sistema de saúde exemplar, e uma cidade cuja infraestrutura foi beneficamente melhorada. Eis alguém que pode mostrar-se como uma alternativa valiosa ao povo goiano.

Enquanto isso, Íris percorre o interior na tentativa de agrupar o maior número de prefeitos aliados. Vai silencioso, com tranquilidade, sem fazer alarde, na discreta surdina. E mostra-se como o palanque mais viável à pré-candidata Dilma Rousseff (PT). Marconi tem vivido alguns momentos de agonia: a pré-candidatura foi lançada, nenhuma novidade, mas o tucano já não conta mais com a mesma estrutura de campanha - brigou com seus maiores aliados, afastou-se da equipe de campanha que o tornou governador e agora defende o Ficha Limpa. Mas é um candidato de nome forte no Estado, peso, traquejo político e tem se mobilizado incrivelmente nas redes sociais para levar o eleitor.

Posta minha singela análise, torço sinceramente para que Vanderlan seja a melhor escolha. Acredito em sua capacidade de gestor para alavancar mais ainda o potencial que Goiás tem, trabalhando com responsabilidade fiscal e equilíbrio. A aula de espanhol naquele dia ficou praticamente perdida em meio aos assuntos ligados à corrupção política na esfera administrativa, legislativa e também no judiciário. Mas cada vez que o ano eleitoral se aproxima, sinto meu coração mais alegre e meu corpo se arrepiar porque é dada a hora de participar do maior gesto cívico da nossa democracia. Porque amo a política! E nesse sentido, boas conversas servem como grandes janelas que abrem espaços e brechas para ouvir aquilo que é novo, que ainda desconhecia, e que pode me enriquecer.

domingo, 9 de maio de 2010

Dia das mães


Foi mais um dia comum. O segundo domingo de maio em que acordei cedo, com um café bem quente pra despertar, um bolo de chocolate pra comer, mas a ausência dela me apertando o coração.

Foi mais um dia de leituras e leituras, em que vi o tempo passar, a cidade enevoar e o frio chegando, arrebatando meus ossos e me deixando sem seus braços e abraços, seu colo, suas lições, seu olhar...

Um dia das mães em que me senti, mais uma vez, quase um órfão que só pode matar a saudade pelo telefone. Mas não custa nada dizer que te amo! E que durma em paz, porque tem bons filhos que zelam por ti e te agradecem pela vida.

Beijos pra minha mãe, e em especial pra todas as mães que moram sem os filhos.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Liberdade de Imprensa


"Liberdade, essa palavra.
Que o sonho humano alimenta.
Que não há ninguém que explique
Nem ninguém que não entenda."
(Cecília Meireles - Romanceiro da Inconfidência)

Faço destas minhas palavras para celebrar este 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Sem esquecer do que disse Yonai Sánchez, a corajosa blogueira de Cuba, que marca a propaganda de Associação Nacional de Jornais (ANJ).

"A censura controla totalmente o que passa diante de nossos olhos.
Não se sabe o que acontece no resto do mundo.
A primeira vez que vi imagens da queda do Muro de Berlim
foi em 1999, dez anos depois de ela ter ocorrido.
Foi num videocassete que um amigo trouxe clandestinamente.
Para assistir às imagens do homem pisando na Lua,
foi necessário esperar vinte anos."

Apesar da garantia constitucional de nossa Carta Magna, o clã Sarney conseguiu formar uma espiral do silêncio contra o Estadão, contando com o aval do magnífico Superior Tribunal de Justiça (STJ). Apesar disso, ainda podemos nos gabar por ter superado os anos de chumbo da ditadura militar, que tanto nos legou apagamentos ideológicos da mente. Mas a luta não acabou, sempre é tempo para garantir nosso espaço de fala, o lugar ideológico que ocupamos! Que tal começar invertendo Mafalda?

domingo, 2 de maio de 2010

Opinião e realidade


Nenhuma opinião é dita como palavras que se jogam ao vento, cruzando os ares como se não tivesse início nem fim. Toda fala tem um princípio e uma razão de onde emanam seus argumentos. Portanto, discursar significa valer-se do passado para transformar o presente, ou em outras palavras, é o velho caiado do novo.

A noite se avolumava enquanto, reunidos em torno da mesa, o assunto atirado às discussões girou em torno de um tema quase que singular para mim: educação. Tudo começou depois que um tio comentou sobre uma reunião de pais que teve na escola do filho dele. As críticas à escola e sua direção foram inúmeras. Ele atacou com veemência o desabafo de uma professora aos que estavam presentes, a qual disse que "não dava mais conta daqueles alunos". Esse mesmo tio repetia que seu tempo na escola foi curto porque estudou até a sétima série, mas reforçava que é inadmissível que a escola permita a desordem de alunos no pátio, a falta de respeito contra os professores e a sapecagem dos estudantes do ensino fundamental.

Suas críticas ganharam outros pais que também estavam na mesma reunião. Estava iniciado o debate. Meu avô não hesitou em argumentar de imediato que os maus alunos deveriam ter 30 dias de suspensão, quando o máximo permitido é três. E ainda se declarou como um possível diretor capaz de colocar a casa nos eixos. Outro tio seguiu a mesma opinião do primeiro cegamente, da mesma maneira que um ministro do Supremo convalida seu voto ao de seu relator sem dar a ele mesmo muito tempo para pensar.

E não poderia ser diferente. Penso que essa posição radical, que condena muito mais a escola do que o aluno, tem uma simples justificativa. Fica mais fácil compreender um discurso quando o analisamos em seu contexto. O contexto desses três adultos era o de uma escola rígida, respeitada, em que ser professor conferia um alto grau de respeitabilidade e admiração no Brasil. Pena que eles valeram-se do passado na tentativa de preservar uma concepção escassa para o presente. A educação daquele tempo já não é mais a de hoje.

Os fundamentos do pensamento, e mais ainda a faculdade de opinar, chega mais perto da verdade quanto mais próximos estamos da realidade. Opina melhor quem tem mais conhecimento, ou seja, mais afinidade com a realidade que vive no seu meio. Karl Marx, sociólogo imortal para os ocidentais, fez uma dura crítica ao pensamento idealista alemão. Segundo Marx, às concepções desenvolvidas por Feurbach e Hegel podiam-se chamar de ideológicas exatamente porque não refletiam a realidade social e história da Alemanha do século 18 - eram ideias e visões distorcidas daquela realidade. Portanto, qualquer teoria para julgar-se válida, e não apenas mera conjectura, deveria sair da matéria para alcançar a ideia, e não sublevar-se do céu para a terra. Isso quer dizer que não pensamos a partir de ideias vagas ou sofridas construções mentais, mas sim dos elementos da materialidade histórica que se absorvem através dos nossos sentidos.

Não obstante, Schopenhauer filosofou algo semelhante. No texto chamado Pensar por si mesmo
, ele admitiu que uma grande quantidade de conhecimentos, se não elaborados por um pensamento próprio, será tão modesto quanto uma rica biblioteca quando desorganizada. O texto é uma sagaz crítica àqueles que julgam-se sábios e medem seu grau de entendimento pela quantidade de coisas que leem e reproduzem com pompa, mas que não conseguem organizar um pensamento próprio a partir daquilo que vive, do ambiente que o cerca e das circunstâncias perceptíveis.

Eu talvez diria o mesmo que meus tios e meu avô. Culparia os professores, diria que eles deveriam ter mais pulso, ser mais firmes e enérgicos no tratamento com os alunos para impôr-se como supremos. Entretanto, minha opinião se revela outra. Em outubro de 2008 fiquei inspirado ao receber o convite de uma escola municipal de Goiânia para participar do projeto Mais Educação, do governo federal. A princípio, diagnostiquei que trabalhar os conteúdos textuais de jornais com os pequenos seria um elemento de exorção à ignorância, além de um inevitável momento para se verificar na prática a validade de Paulo Freire e Vygotsky.

Nada disso se fez. O que verifiquei foi uma escola cansada, pálida e injustiçada. Professores doentes, cuja energia vocal era completamente dissolvida pela jornada de 40 horas de trabalho semanal exaustivo e degradante. Um aluno, de aproximadamente 11 anos, chegou a agredir uma professora com um tapa no rosto, o qual ela não pode compensar. O máximo que fez foi sentenciá-lo verbalmente. Alunos que não respeitam o professor, que não querem aprender, desinteressados, completamente desequilibrados por conta de uma estrutura familiar precária à qual destinou à escola outros papéis e obrigações que não a pertence. Foi esta a realidade que encontrei. E que me abalou, dilacerou minhas esperanças, frustrou minhas expectativas, derrubou meus ânimos e me fez desacreditar de Freire e Vygotsk. Hoje só me resta acreditar que a instância escola deveria ter leis próprias, com autonomia concedida pelo Legislativo para vigiar e punir, nada mais justo. Porque só quem nela trabalha sabe o peso que carrega e a medida de seu sofrimento.

Ter opinião livre, ainda bem, é uma premissa incondicional garantida no Brasil, e isso está na Constituição. Utilizei os mesmos argumentos acima naquele debate, entretanto, fui praticamente silenciado por pessoas que não quiseram ouvir. Por pessoas que têm opiniões sinceras e livres, mas que desconhecem a realidade e a quem lancei o distante desafio de entrar numa sala de aula para ver como as coisas funcionam. E disso posso falar com firmeza porque eu vivenciei o que é a escola hoje, tal qual a descrevi. Portanto, vale a lição mais nobre que poderia deixar: não se pode desvincular opinião de realidade. Se o pensamento e o discurso que verbalizamos nos remetem à experiência mais subjetiva que temos, então é melhor ter cuidado com o que se vai dizer para evitar expressões desconexas que remem contra a maré da vida.

sábado, 17 de abril de 2010

Impressões


Em apenas uma semana, vivi algumas experiências importantes. No domingo (11), fui submetido a testes, que de uma maneira ou de outra, me colocaram à prova quando o assunto é conhecimento. Depois disso, um show inesquecível para abrir uma semana que geraria novidades pouco previsíveis.

Pra começo de conversa, vou iniciar falando do show. Depois de uma prova extensa, que ao final me deixou boas expectativas, corri até em casa, coloquei um abadá verde, e segui estrada
à fora comendo um pão de queijo enquanto meu irmão conduzia. E ai de mim se não o tivesse feito! Foi então que pisei no estacionamento do Flamboyant, sentindo uma leve dor na coluna, na região do ombro, no pescoço e que, por fim, acabaria na cabeça. Nada que uma dipirona sódica não desse uma amenizada!

Chegou o tão esperado grande dia! Finalmente o show de Asa de Águia com Jorge e Mateus! O anúncio já havia chegado a mim em um outro show de uma jovem dupla sertaneja. Mas este prometia ser inesquecível! Bruno, meu comparsa e primo, já havia se disponibilizado como companhia, seguido de outras mais que arrumei.

Pena que tive a tal da prova antes. Quando cheguei lá, Asa tocaria por apenas mais meia hora, enquanto eu não pude dar a devida atenção ao grupo baiano porque discava no celular e movia meus olhos atentamente para encontrar a amiga Silvana. Nada feito. Nem Silvana, nem Bruno e Michelle, nem Laís! À primeira vista, minhas expectativas foram se esgotando e eu prevendo que aquele show não me animaria o quanto esperava.

Foi então que, no meio daquela multidão envolvente, que a cada passo que dava me espremia, me agitava, me molhava de cerveja e pizava no meu pobre pé, esta cabeça pensante começou a operar alguns pensamentos teóricos dignos de mim e que não me deixam nem mesmo nos maiores momentos de euforia alcoólica. Agonizado por uma intensa solidão, sofrida porque ainda não encontrara meus pares para dançar e beber, acabei me centrando em um único aspecto: no homem-massa. Ahh, a prova do concurso muito me servira para isso. Estudei muito, recorri a Mauro Wolf, e lá estava ele, o homem-massa. E foi assim que eu me senti naquela imensidão de gente. Esta experiência me rendeu a oportunidade de verificar
in loco a verdade científica: lendo apenas no livro, agora eu viveria na prática o que é o homem-massa, assim, isolado, individualizado, homogêneo, indiferenciado, atomizado. E foi exatamente desse jeito que me senti. Tão pobre, frio, abandonado, relegado a uma situação completamente inusitada para quem se aventuraria em um show...

E foi assim que passei um bom tempo. Apenas observando, de longe, a multidão que se arrastava atrás do trio elétrico. E foi assim que os copos de cerveja rolavam pelo ar e me faziam ver o quanto eu era apenas mais um naquele meio, despido de todas as minhas virtudes, para ser mais um número de bilheteria no faturamento do show. E foi então que, enquanto meus neurônios se emaranhavam nesse pensamento, depois de ligações telefônicas mal-sucedidas, que finalmente vi Laís se mexendo, e pude comemorar por não estar mais sozinho. De dois contatos feitos, eu não tinha encontrado nenhum. Agora sim, eu teria companhia, oxalá! E depois dela vieram se somar a mim Bruno, Michelle, e até Eduardo, por quem eu realmente não esperava ver no show. E vi o Rodrigo da academia... E aquele show que até então não parecia mais valer a pena, tornou-se, de repente, maravilhoso, e grande, alegre e cheio de luzes!!

Ahh, eu poderia ser mais um número, mas já estava feliz por ter encontrado meus pares para a festa, no que me restou apenas celebrar, curtir o sertanejo maravilhoso da dupla que me encantou e arrasou ao trazer ao trio participantes de peso como Marrone, Cesar Menotti e Fabiano e algumas inovações das faculdades de Agronomia da UFG que tentam um lugar ao sol no
happy hour musical. E ainda gravaram um DVD ao vivo para o Multishow, gente! O que tem de melhor? Goiás, apesar de suas raízes agrárias, tem uma música ímpar que me faz arrepiar e o coração bater mais forte! Jorge e Mateus, não é pra menos... "larga tudo e vem correndo...".

Sobre notícias
Aproveitando o espaço, vale aqui um curto parágrafo para uma breve reflexão proporcional ao seu tamanho. Numa redação, ainda mais de TV, pude constatar que Traquina está bem colocado! Ahh, eu já imaginava, estava com esta hipótese! O tempo é tão tão curto que mal dá pra pensar. O jeito é apurar logo o que vai ser notícia. Critérios de noticiabilidade? Devem estar inconscientes nas nossas mentes inquietas. Os fatos nos consomem de forma tamanha que mal consigo os avaliar de imediato. Mas digo, e repito, não vou afogar o singular, não vou asfixiar meu projeto... Tudo o que se discursa tem um porquê, uma razão. Não há acasos na vida, nem nos fatos. Porque o que ambos fazem (bem como qualquer outro tipo de prática), só se realiza a partir daquilo que já existe, que está previamente estabelecido. Por isso reitero que todo fato tem uma explicação, tal qual a psicanálise observa que toda fala vem de algum lugar.

Até breve, estimado leitor!

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Dia D


Ahh, socado dentro de casa, enfiado na toca, quieto, silencioso, pensativo. É assim que tenho passado nos últimos dias, enquanto me concentro para alguns desafios que podem me fechar portas ou abrir algumas janelas.

Entretanto, fui pego de surpresa. Ao abrir meu correio eletrônico, deparei-me com um e-mail que me alertava para a comemoração de hoje. Eu não me lembrava, havia me esquecido que no 7 de abril celebramos o Dia do Jornalista.

Em pouca palavras, eu diria que hoje seria um dia ideal para pensar melhor. Para observar, analisar, encontrar as contradições. O que esperar de uma profissão tão desprovida de regulamentações, complexa, mas excitante? Muito me preocupa saber que "o movimento da selva" continua tão abarrotado de imperfeições, de problemas que poderiam ser sanados caso o poder de comunicar fosse exercido com mais propriedade e consistência por seus respectivos sujeitos.

Não por acaso, hoje seria um dia típico para pensarmos melhor, e coletivamente, nos caminhos que queremos seguir. Tal qual a figurinha desse post, pretendo dormir muitas noites e acordar feliz nos dias seguintes caminhando adiante na profissão que escolhi para o resto da vida, e na qual minha alma deverá se iludir e sustentar-se. Por enquanto, me restam dúvidas, um pouco de tristeza, e sobretudo, a esperança de que, quem sabe, em breve farei parte de um grande time para o qual me preparei há quatro anos. Vou esperar as águas de março findar o verão.

terça-feira, 30 de março de 2010

Lília, no coração de Goiás




Lília Teles não é um nome qualquer. Advogada, professora de educação física, mãe, goiana, simpática, alegre, jornalista. Lília atingiu o ápice da carreira de repórter depois de se tornar correspondente internacional de TV Globo em Nova York, passando por coberturas que marcaram o mundo e fizeram história.

Na última terça-feira, dia 30, o magnetismo da repórter, que conquistou o mundo ao mostrar as consequências do terremoto que devastou o Haiti, foi tamanho, que fez uma plateia inteira ficar em absoluto silêncio para ouvi-la. No teatro da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Lília Teles foi recebida por estudantes dos mais diversos cursos: nutrição, fonoaudiologia, jornalismo, direito, medicina entre tantos outros. Ela conseguiu hipnotizar o público que transbordava de curiosidade, olhares atentos e uma sensibilidade infinita que transpareciam a emoção e o orgulho que os goianienses têm ao ver o maior ícone do jornalismo goiano em nível transnacional em frente de si mesmo. Lília recebeu também o apoio incondicional da família, que se fez presente dos pais aos irmãos, sobrinhos, filho (André) e primos.

A jornalista, centro das atenções, foi homenageada pela pró-reitora de Pesquisa da PUC-GO, professora Sandra de Faria e pela diretora do departamento de Fonoaudiologia, Luciana Alves Machado, que lhe rendeu um belo texto com inúmeras homenagens. Lília iniciou sua palestra, intitulada "Voz na Globalização", contando sua trajetória profissional em ordem cronológica. Ela relembrou o primeiro passo dado na carreira, quando foi repórter do jornal Diário da Manhã, passando pela então TV Goyá (hoje Record) até chegar à TV Anhanguera, onde consolidou-se como repórter.

Jovem e interessada, Lília Teles diz que nasceu jornalista: escrevia no jornalzinho da escola, era a primeira aluna a levantar o dedo quando a professora perguntava quem queria ler a lição e ainda entrevistava os familiares com um cabo de vassoura ao término da viagem para a fazenda. Lília permaneceu na TV Anhanguera de 1989 a 1997, período em que foi a segunda repórter de rede em Goiás. Depois mudou-se para o Rio de Janeiro, onde cursou jornalismo e batalhou intensamente para realizar o sonho de ser correspondente. Ela contou que lutou muito para crescer na profissão, o que lhe custou a perda de muitos momentos com a família, como a comemoração do Dia das Mães, conforme narrou em meio a gotas e gotas de lágrimas arrancadas dos olhos.

Mas foi em Nova York, como correspondente internacional da TV Globo, que Lília Teles mostrou ao Brasil e ao mundo o potencial que tem: ela participou de inúmeras coberturas marcantes, como a posse de Barack Obama, a morte de Michael Jackson e por fim, o terremoto no Haiti que mexeu até mesmo com sua estrutura emocional. Passou por momentos tensos ao chegar na capital do mundo, ainda tão amedrontada pelos atentados do 11 de setembro de 2001 que culminaram com a queda do World Trade Center. Também lá viveu momentos difíceis, como intenso frio e solidão (isso sem falar da saudade que sentia das terras quentes de Goiás quando procurava uma pamonha, e brincou - "Veja bem, num mundo tão globalizado como esse não encontrar uma pamonha como a feita em Goiás aqui em Nova York!").

Lília também falou sobre a crise financeira causada pelo setor hipotecário dos Estados Unidos, interpelando como é que um país tão rico poderia entrar numa situação de quebradeira em efeito cascata. E também a sua inacreditável recuperação. Ela lembrou ainda a cobertura das eleições americanas, quando viajou no avião do lendário John McCain, militar de 80 anos que exitava em se tornar presidente, e conheceu jornalistas do mundo todo. Na posse do primeiro presidente negro do país, ela sofreu com o intenso frio: "Foi o dia mais frio da minha vida" - disse - suportando temperatura de menos 12 graus com sensação térmica de menos 23. Seu pé estava congelado, o que a obrigou a pedir para duas senhoras cuidadosamente agasalhadas (com roupas que mais pareciam de astronautas, segundo a palestrante) que tirassem uma foto com ela na tentativa de aquecer-se. Mas reconhece que "o que valia a pena era estar fazendo parte daquela história" - cujo envolvimento convidava qualquer jornalista à tentação de estar naquela cobertura!

Para encerrar, ela tratou do aquecimento global e das nevascas perturbadoras que alteraram muitas estradas e rotinas nos EUA e Canadá. E finalmente, o momento mais marcante: a tragédia do Haiti. A este fato Lília Teles dedicou grande parte de seu discurso - entremeado por muito choro somado a alguns goles de água. "Foi a cobertura mais importante que fiz na minha vida e a mais triste", resumiu. Ela conta que é como se encontrasse um país completamente destruído, como se tivesse sido bombardeado, e do qual as pessoas não tiveram como sair e se defender. "A minha vontade era de gritar e chorar". Lília recordou o resgate da enfermeira haitiana, um dos mais emocionantes, e também de três crianças que foram soterradas por um prédio de três andares. Não é à toa que a capa da revista da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) trouxe sua foto com a legenda "A Lília salvou essa mulher".

A notícia sobre a tragédia do Haiti correu o mundo em poucos minutos, configurando uma equação balizada pela voz na globalização. Lília agora descansa e aproveita o período de férias antes de voltar para o Rio de Janeiro. Ela curte a família em Goiânia, visitará a Cidade de Goiás para reviver a procissão do fogaréu e no momento escreve um livro para lhe ajudar a extravasar a catarse que encheu seus olhos de dor em Porto Príncipe. Ela foi substituída pelo novo correspondente, Flávio Fachel. Mas é certo que, se na época da morte do cantor Leandro, ao revê-la os goianos gritavam esbaforidamente "volta, Lília", "volta, Lília", agora ficou eternizadamente imaculada no coração desse mesmo povo que a recebeu com tanto carinho na noite de ontem! Lília Teles oxigenou as expectativas de vários estudantes de jornalismo que pretendem fazer carreira na profissão e retribuiu à altura os gestos atenciosos recebidos por seu público. Sem sombra de dúvida, Lília Teles está no coração de Goiás.

terça-feira, 9 de março de 2010

Discurso de formatura


Quero inicialmente cumprimentar os membros desta mesa diretiva formada pelo magnífico reitor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, professor Wolmir Amado, à coordenadora do curso de Jornalismo da PUC, professora Sabrina Moreira de Morais Oliveira. Ao paraninfo desta turma, diretor do Departamento de Comunicação da Prefeitura de Goiânia, deputado Lívio Luciano, pelo apoio incondicional prestado à nossa turma. Cumprimento nosso padrinho, professor Salvio Juliano e a professora homenageada Noêmia Félix. Quero ainda saldar a presença do repórter da TV Anhanguera, Fábio Castro, que neste ato representa nossa patronesse, a correspondente internacional da TV Globo em Nova York, Lília Teles, que dá nome a esta turma, mas que não pôde estar presente em razão de uma mudança na data de seu retorno ao Brasil. E agradeço ainda o repórter do jornal O Popular, Vinicius Sassine, vencedor de inúmero prêmios nacionais com reportagens investigativas e científicas, profissional que hoje homenageamos. Aos amigos, familiares e a todas a pessoas que vieram abrilhantar esta colação de grau, muito boa noite.

No dia 12 de janeiro de 2010, a população haitiana saiu às ruas para viver um dia comum. Entretanto, por volta das 16 horas e 53 minutos (hora local do Haiti), aquelas pessoas que transitavam pela capital do país mais pobre das Américas tiveram sua rotina completamente alterada. Um terremoto de magnitude de 7 graus devastou a capital do Haiti, Porto Príncipe. Mais de 200 mil pessoas morreram, 300 mil ficaram feridas e cerca de 4 mil tiveram amputações após o tremor. O maior terremoto dos últimos 30 anos deixou ainda 250 mil casas e 30 mil empresas destruídas, além de mais de 1 milhão e 200 mil desabrigados. As proporções do desastre superaram os efeitos da bomba atômica de Hiroshima. Na última semana, o Chile também enfrentou um terremoto de 8,8 graus cujas consequências afetaram vários outros países vizinhos. E em meio a tudo isso, os cabos de fibra ótica, as imagens de satélite e as transmissões via internet possibilitaram que, em questão de minutos, o mundo inteiro se desse conta desse desastre. E foi a partir dessas informações e as imagens captadas pelas câmeras de televisão que a humanidade manifestou um de seus atributos mais valiosos: a solidariedade. Conclusão: a informação jornalística veiculada é instrumento de ação sobre o mundo. É capaz de fazer as pessoas se mobilizarem e agirem sobre a realidade para transformá-la, já que construímos o mundo através da palavra. "Ai palavras, ai palavras, que estranha potência a vossa!", resumiria Cecília Meireles.

Entretanto, mecionar um único fato seria muito pobre. Conclui que esse discurso se tornaria opaco e vazio caso não conseguisse descrever à altura o que constitui o jornalismo na sua essência. Definir o que é jornalismo não é uma tarefa tão simples assim, pois isso implica em lidar com uma série de questões para as quais não há consenso: afinal, o que você pensa do velho ditado americano segundo o qual vale muito mais ter uma imprensa sem Estado do que um Estado sem imprensa? Mas espere aí, me acompanhe. Eu convido você a fazer uma profunda reflexão sobre o assunto.

Se mergulharmos na história da imprensa, perceberemos que o jornal foi um objeto essencial para a consolidação das sociedades modernas. No século 19, as primeiras publicações jornalísticas preocupavam-se em divulgar textos de caráter literário e político. Mas foi o avanço do capitalismo comercial que impulsionou o desenvolvimento do jornalismo, criando novas demandas e necessidades que até então estavam latentes. Entretanto, a atividade jornalística não se reduz a mais uma mercadoria com valor de uso e de troca no mercado do capital. Certa vez, disse o filósofo Jean-Paul Sartre: "O jornalismo é uma mercadoria, mas não uma mercadoria qualquer".

Compreender o jornalismo significa observar quais fatores sociais e históricos permitiram o seu desenvolvimento. Uma coisa é certa: somos profissionais da informação. E o que significa informar senão dar forma a alguam coisa, fazer com que um assunto até então desconhecido torne-se público, mudando o estado de conhecimento do receptor? Pois bem, atravessamos séculos de imprensa para estar aqui. O capitalismo, ao certo, não é um acidente na História. Mas o que podemos dizer é que este modo de produção acelerou nossa rotina de vida, provocou uma dinâmica integração socioeconômica entre as nações (e a crise financeira mundial é prova disso), e, por fim, fez com que a obtenção de informações, de dados e análises sobre o panorama econômico, político, cultural e científico se tornasse uma necessidade irremediável às populações. O jornalismo é uma atividade profissional que, ainda que não cumpra com integridade o seu papel, também não pode ser negada.

Neste contexto, podemos perguntar: o jornalismo é um instrumento político de manipulação das massas ou um caminho para se atingir a cidadania? A notícia é um processo de construção que serve para dar sentido à realidade e guiar nossas ações? Pode-se dizer que os gêneros textuais jornalísticos são uma forma de conhecimento, como o são a ciência, a filosofia e a arte? Todas estas questões são ambivalentes. Dependerá do ponto de vista de quem as vê. Mas posso dizer, de passagem, que mais do que nunca, os jornalistas são promotores públicos da cidadania e profissionais qualificados para informar, analisar e refletir sobre a realidade. É por isso que "jornalista", quer dizer "analista do dia". Segundo Adelmo Genro Filho, grande teórico do nosso meio, o jornalismo é uma forma de conhecimento centrada na categoria filosófica do singular. Isso significa que a notícia, matéria-prima do nosso trabalho, contém indícios capazes de explicar o porquê de um fato, os fatores históricos, ideológicos, políticos e sociais que justificam a existência de um acontecimento, além de mostrar o caráter inusitado e contraditório da vida. Creio que por isso um jornal carioca criou recentemente uma peça publicitária que dizia: "Todo fato tem uma explicação".

Se considerarmos então que o jornalismo é uma forma de conhecimento que também explica e significa a realidade, ao seu modo e de acordo com as suas particularidades e limitações, teremos lhe permitido um status epistemológico próprio. E isso implica em reconhecer que esta profissão não é uma prática simples e meramente operatória, mas sobretudo, um trabalho intelectual. Portanto, precisa de pessoas devidamente habilitadas para um ofício de extrema responsabilidade social, se quisermos que a informação construa um mundo de caráter democrático, cidadão e plural. E só este argumento já basta para que o Congresso brasileiro mostre ao Supremo Tribunal Federal que ser jornalista por formação não fere de maneira alguma a liberdade de expressão prevista pela Constituição Federal.

Não poderia encerrar minha fala sem antes agradecer às pessoas especiais que fazem parte das nossas vidas. À Deus, o princípio e o fim de todas as coisas. Aos pais, verdadeiros guerreiros, nossos genitores, pessoas fundamentais a quem devemos muito do que temos e somos. Vocês, pais, são elementos determinantes na constituição do nosso caráter e da nossa personalidade. São arquétipos a partir dos quais nos projetamos, timão de um barco que nos guia assim como uma bússola mostra os pontos cardeais. Obrigado pelo amor e pelos valores que introjetaram em nós. Aos nossos amigos, pessoas com que compartilhamos nossas vidas. São aqueles que nos escutam nos momentos mais adequados, e que também dirigem a nós palavras essenciais com o mesmo cuidado com que usariam uma esgrima.

Professores, se hoje nos tornamos jornalistas é porque vocês cumpriram com responsabilidade o papel de ensinar. Transferiram com sabedoria experiências e conhecimentos, elementos libertadores. O conhecimento é a única coisa que ninguém pode nos tomar, pois está aqui, dentro de nós. Quem encontra bons professores jamais se tornará um pote vazio.

Colegas, como o tempo passa rápido... é como se tivéssemos nos conhecido a tão pouco tempo. Concluir um curso superior é uma grande conquista, pois nem todos os jovens brasileiros têm a mesma oportunidade. Foram quatro anos em que vi, pouco a pouco, cada um tentando lidar com as próprias dificuldades, superando obstáculos, crescendo, se transformando. Fomos a primeira turma de Jornalismo da PUC de Goiás, inevitavelmente submetidos a testes, mas cercados por um cuidadoso projeto pedagógico de curso. Sabe aquela história de que nunca passo num mesmo rio por mais de uma vez? É verdade. A água do rio por onde passei correu para o mar, evaporou, mudou de estado físico e se precipitou na forma de chuva, mas não é mais a mesma. Assim também nunca somos os mesmos. A cada dia nos tornamos alguém modificado, enriquecido e diferenciado porque vivenciamos experiências que jamais se repetem.

E aí eu pergunto: o que fica? Me arriscaria a dizer que ficam o respeito que temos um pelo outro e a nossa amizade. Nossa turma é diversa e heterogênea, mas somos nada mais do que aquilo que nos fizemos ser. Sejam éticos e íntegros com todas as informações que apurarem. Prezem pela verdade e lutem para construirmos um mundo de paz e solidariedade. Respeitem a sua fonte de informação e neguem-se a fazer tudo o que contrariar a sua postura moral e profissional. Busquem a objetividade, mas lembrem-se de que não somos uma neutra correia de transmissão de informações. Afinal, a tese da objetividade caiu por terra depois que Freud descobriu que a subjetividade determina o tamanho da riqueza e da complexidade de que são feitos os seres humanos. Eu pergunto: que lugar você ocupa? Qual papel você desempenha como jornalista e que projeto de sociedade tem para a sua nação? Pensem nisso! E jamais se esqueçam de tudo que vivemos juntos. Recordem-se das aulas animadas de TV da Consuelo, da tranquilidade do Salvio e da carga elétrica de 200 voltz da Noêmia. Ahh, e que dizer das aulas de mitologia grega do Minuzzi? Isso sem falar daquela prova difícil da Sabrina em que tínhamos que desvendar o segredo da pirâmide. Mas foi no nosso primeiro e último churrasco que finalmente nos entendemos enquanto turma, não é verdade? Comissão, apesar dos percalços, tivemos pulso suficiente para organizar esta noite brilhante, porque, no final, tudo se ajeita. Eu e a Luna então, fomos um caso de amor e ódio. Mais de amor do que de ódio, né, Luna?

Quero lembrar também de todos aqueles que passaram pela nossa sala, mas que pelas circunstâncias e histórias de vida, não se graduaram conosco: Paulo César, Hugo, Valéria, Poliana. E ainda a colega Leila Andrade, que interrompeu a própria vida.

Colegas, penso que cada um de nós, há exatamente quatro anos atrás, entrou na universidade com um propósito, à procura de alguma coisa. Acho que hoje, nós a encontramos. E por isso quero registrar aqui uma última mensagem. Fernando Sabino, escritor, poeta, literato, boêmio, jornalista, disse assim: "De tudo ficaram três coisas: a certeza de que ele estava sempre começando, a certeza de que era preciso continuar, e a certeza de que seria interrompido antes de terminar. Fazer da interrupção um caminho novo. Fazer da queda um passo da dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da procura um encontro".

Que essas palavras e esta noite tão especial se tornem atemporais na vida de vocês. Muito obrigado!

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Há poucos dias


Há poucos dias de minha formatura, preparo minha alma e meu espírito, e sobretudo, meu emocional para viver momentos intensos, daqueles típicos que me fazem fechar os olhos, me arrepiar com o que está por vir e chorar muito (e deixar esse meu alérgico olho vermelho e marejado) para finalmente me consagrar como graduado em Jornalismo.

Por enquanto, tenho passado dias exaustivos, de muito cansaço e estresse, de muitas dores e preocupações para que tudo saia certo, nos conformes, para que as horas no dia 03 de março se eternize, para que esse momento se torne atemporal, e atravesse a todos profundamente.

Foi há tanto tempo... e parece que o tempo, conceito relativo para a física, tivesse entrecortado os ares com a mesma rapidez com que a velocidade da luz atravessa o universo. Até agora, resta em mim um pouco da luz de um estudante cujas amarras profissionais ainda não apagou. Resta a esperança, aquele que surge das cinzas e nos faz ressuscitar, ou melhor, nascer pela segunda vez.

Faltam poucos dias e meu coração se prepara. O sangue bombeia oxigênio por essas veias que se esticam e fazem minha pressão pulsar e coração chegar até a garganta. Depois desse rito de passagem, minha vida seguirá novos rumos. Por hora, me assusta o fato de imaginar que sou adulto, e ter que parar pra pensar qual é o projeto de vida que tenho para mim daqui pra frente. Afinal de contas, você já pensou no seu?

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Lula, o filho de dona Lindu

Não sou crítico de arte nem especialista em cinema. Mas resolvi abrir este blog com uma análise sobre o filme de Lula.

"Você sabe quem é esse homem, mas não conhece a sua história". Assim dizia o trailler do filme. Era pra ter assistido o filme logo que estreou, em janeiro. Para tanto, aproveitaria o clima nordestino de Aracaju para honrar o sertanejo que se tornou presidente da República. Não deu. Voltei a Goiânia e só então numa quarta-feira pude ver o filme do "cara".

Escuridão. As luzes se apagam, pessoas continuam subindo já atrasadas. Vejo os traillers. Depois de muita badalação com o que está por vir, o filme começa com uma frase de efeito: "Este filme não recebeu apoio dos governos federal, estadual e municipal para ser feito". As letras brancas em meio à película negra informavam ainda quais empresas foram responsáveis pelo patrocínio cultural que alavancou a produção do filme... Isso porque a imprensa informou, à época de sua pré-estreia, no Festival de Cinema de Brasília, que muitas estatais inundaram o caixa para rodar o filme. Nada de doações, apenas contribuições ao fomento do cinema brasileiro. Polêmicas à parte, vamos ao que interessa.

O fato é que o filme de Lula começa exatamente onde estão suas origens. Do sertão de Caetés, nos confins do Pernambuco, saiu um dos caçulas de dona Lindu que um dia, de tanto teimar, conseguiu ser presidente. Lula - o filme - foi inspirado na história que conta Denise Paraná em um livro de mesmo nome.

A trajetória de Lula em muito se assemelha à vida de milhares de brasileiros. Pobre, morando apenas com a mãe e os irmãos numa casinha simples de fazenda, acaba entrando nas estatísticas do êxodo rural de um Brasil que começava a se industrializar e se modernizar na década de 50, no período pós-Getúlio Vargas. Com a mudança do pai para Santos, no litoral de São Paulo, dona Lindu vende todos os bens e parte, posteriormente, para a terra do café na tentativa de conseguir uma vida melhor para seus filhos. Lá, Lula conheceu pela primeira vez seu pai, um homem alcoólatra, retrógrado e impulsivo.

O filme narra a situação de vida de Lula e de toda uma geração. Luiz Inácio entra para a escola (para o desgosto do pai, que ao descobrir tenta até agredir dona Lindu por ter incentivado os filhos a estudar). Depois disso, ao mudarem-se para São Bernardo do Campo - na região do ABC paulista, local onde se concentra grande parte das indústrias siderúrgicas do país e que se tornou o reduto político de nosso presidente - o protagonista ingressa na escola de formação do Senai.

De fato, não se pode prescindir que a vida de Lula foi cercada de obstáculos e dificuldades. Mas além disso, e muito além de tudo isso, Lula sempre contou com uma figura de peso em sua vida: dona Lindu. Ela se tornou, na ausência da figura paterna de seu Aristides, o centro e o norte da casa. "Tu vai se chamar Luiz Inácio"- diz a personagem de Glória Pires quando o filho nasce, evidenciando o poder que têm as palavras quando são ditas, bradadas ao vento com toda a força.

"Vai com cuidado, porque o santo é de barro"- diz dona Lindu quando o filho assume o Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de São Bernardo. Com essas e tantas outras frases de efeito, Lindu ganha na trama um papel tão relevante quanto o do filho. O filme deixa patente a afinidade de um pelo outro. Além de reconhecer o potencial de uma mãe corajosa que foi capaz de levantar o ânimo do caçula nos piores momentos de sua vida, tal qual ocorreu quando ele perdeu de uma só vez a esposa e o filho.

Filme, para mim, precisa ter alguns atributos fundamentais. Tem que ser especialmente emocionante, daqueles que nos sensibilizam, ou então precisa ser inteligente, me fazer pensar, refletir sobre a materialidade da vida que faz aquele discurso cinematográfico ter sua existência justificada. "Lula, o filho do Brasil", ao contrário do que pensava, não me ganhou por nenhuma dessas duas características. O filme mistura cenas gravadas com imagens reais da ditadura militar, numa completa dessincronia e estética desagradáveis. Além disso, emociona muito pouco e não reflete com presteza a personalidade do homem que viria a ser o primeiro líder de esquerda a governar o País após a Redemocratização.

Mas uma coisa é certa. Fábio Barreto poderia ter acertado muito mais se escolhesse outro título para a trama. Eu prefiro "Lula, o filho de dona Lindu". Acho que seria bem mais cabível, já que demonstraria a ambiguidade de seus personagens centrais: Lula é muito do que hoje é porque teve uma mãe amiga, cativante, determinada. Lula e dona Lindu, protagonistas de uma mesma história.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Meu espaço

Desde o ano passado venho pensando na necessidade de criar um espaço pra mim. Não um espaço espontâneo de fala (isso eu fiz o ano todo num lugar especial), mas sim um cantinho onde pudesse materializar minhas ideias, já que a fala se dispersa e se perde.
Também tive apoio de muitas pessoas pra realizar esta tarefa. Professores (e dá-lhe Papini) e amigos que me incentivaram a entrar de vez no mundo online para textualizar. E é por isso que agora, mesmo já tarde da noite e cansado depois de viver um dia de muitas turbulências, resolvi instantaneamente criar este blog.
Aqui você poderá encontrar um lugar com o qual, talvez, se identifique. Minha tarefa é escreve sobre muitas coisas, e sobretudo acerca dos fatos cotidianos que precisam ser mais bem analisados. Este é um espaço para minhas reflexões acerca dos acontecimentos da cobertura jornalística, que muitas vezes se faz pobre porque não significa os fatos e nem dá à notícia uma dimensão histórica. Também aqui o leitor encontrará textos que resumem minhas ideias e pensamentos sobre o mundo e a vida, minhas filosofias.

Que tal? Então mire o seu olhar sobre o que eu vou dizer.
Meu espaço. Thiago Freire, agora textualizando!